Como se preparar para o parto?

por | jan 2, 2023 | Parto humanizado

Após anos de atuação como obstetra, grávida do meu primeiro filho, fiz uma pergunta marcante durante meu trabalho de parto:

“Como que se prepara pra ISSO?!?!” (rs)

Eu considerava realmente que estava preparada: como profissional, estudo e informação não me faltavam; eu me alimentava bem, fazia atividade física regularmente, estava em condições mentais e emocionais muito favoráveis para viver a gestação e o parto. Havia testemunhado tantas e tantas mulheres fazendo suas travessias… julgava que conhecia o processo.

Mas, na prática, a verdade é que a intensidade do parir é inédita e arrebatadora! Entre uma contração e outra, eu achei que não estava preparada naquele momento. Durante as contrações, eu recebia a mais concentrada vivência de aqui-agora da vida.

Mas, então, não tem preparação? Tem sim. 

Hoje sei que estava, sim, preparada. Toda mulher nasce preparada. O desafio é identificar as questões culturais que nos atravessam e atrapalham e aprender a lidar com elas.

Além de um estilo de vida saudável, que realmente ajuda, três fatores são, de fato, muito importantes (e fizeram diferença pra mim!):

1. Desejo:

Fortaleça seu desejo, sua vontade de parir. Alimente a convicção de que esse é o caminho mais natural, fisiológico, benéfico e seguro para que você e seu bebê se conheçam ¹.

Hoje percebo o quanto a força potente desse desejo me sustentou. Havia um alinhamento, uma coerência entre o que a cabeça pensava, o coração pulsava e as carnes sentiam. Tão forte que, mesmo com as dores e as dúvidas que balançaram esse alinhamento durante o processo, ele permaneceu lá, vivo.

Chegarão dúvidas e desencorajamentos aos seus ouvidos. Identifique-os e os coloque dali pra fora, sem deixar que alcancem e enfraqueçam suas convicções.

Mulheres nascemos prontas, nossos corpos nascem competentes.

Há que se (re)acreditar na sabedoria da Vida e da Natureza que desenvolveu esse mecanismo de parto, essa cascata hormonal, que sustenta e mantém a humanidade desde milhares de anos.

2. Informação:

Busque informações que te façam ainda mais poderosa, que te deem condições de fortalecer a potência e a competência que são inatas em você. 

Vá entendendo que é preciso separar o joio do trigo. A história (geralmente trágica) da prima da vizinha da amiga não costuma ser uma boa fonte de informações…

Saiba que vivemos num país em que mais da metade dos nascimentos ocorrem por meio de uma cirurgia², supostamente desejada pelas mulheres³. Essa taxa é muito diferente da que é preconizada internacionalmente como segura e necessária (10%-15% de cesarianas)⁴. Pesquisa brasileira revela que 1 em cada 4 mulheres relata ter sofrido algum tipo de violência no momento do parto⁵, dos mais diversos tipos: física, emocional, etc⁶. Além disso, persistem sendo ensinadas e praticadas indicações de cesariana⁷ e condutas assistenciais (como a episiotomia – corte no períneo, entre a vagina e o ânus⁸) que não encontram respaldo em evidências científicas.

Parece uma etapa difícil do caminho, mas é com informações verdadeiramente seguras que o exercício da autonomia e do poder de escolhas é pleno.

3. Apoio

Você pode e deve estar muito bem acompanhada nesta travessia. Encontre uma equipe que acredite nas mesmas coisas que você e, principalmente, que acredite EM VOCÊ.

Conte com o/a companheiro/a, com a doula⁹, com profissionais que possuem alinhamento e engajamento com essa forma de cuidar (enfermeiras obstetras/obstetrizes, médicas/os obstetras, pediatras, fisioterapeutas, etc). 

  • Qual a taxa de cesariana de profissionais que vão te acompanhar ou da instituição onde você pretende dar à luz?
  • Como é tratado o assunto parto nas consultas de pré-natal? Suas dúvidas são acolhidas desde o primeiro encontro ou o assunto é adiado para um momento teoricamente mais oportuno?
  • Sua parceria, quem você escolheu para te acompanhar na travessia, recebeu as mesmas informações que você, esclareceu também as dúvidas e acalmou as angústias? Saberá reconhecer que, apesar da dor que realmente faz parte do processo, parir não está ligado a sofrimento necessariamente?

Tenha ao seu lado quem diga: “Acredita, você está indo muito bem; essa dor não é maior do que você.”

Se eu pudesse dizer qual é o mais importante dos três, nesse contexto social e cultural em que vivemos, diria que é o desejo. É ele que te dará o gás necessário para fazer os outros movimentos: buscar informação de qualidade e apoio alinhado, cuidar da saúde…

Ah! Importante saber que o parto é a sincronia do desejo da mãe com a sua fisiologia, sua relação com o bebê ou com as necessidades do bebê.

Imprescindíveis são a entrega e a resiliência. 

Nem sempre o parto acontece do jeito que a gente deseja, independente do quanto você tenha de apoio e informação. Entrega e resiliência são necessárias para quando as mudanças de planos acontecem.

Dentro de uma assistência respeitosa, num cuidado individualizado, em que direções e decisões são tomadas com seu consentimento, a experiência de trazer à luz um ser é satisfatória, positiva, preenchida de belos significados.

1. Um dia de vida (Ministério da Saúde) https://www.youtube.com/watch?v=cZFB2KEb2xE&feature=youtu.be

2. Nascer no Brasil: pesquisa revela número excessivo de cesarianas https://portal.fiocruz.br/noticia/nascer-no-brasil-pesquisa-revela-numero-excessivo-de-cesarianas#:~:text=O%20estudo%2C%20o%20maior%20j%C3%A1,por%20meio%20desse%20procedimento%20cir%C3%BArgico.

3. A vida pede passagem (https://drive.google.com/file/d/0B6qhP90iaZFQdWk2MlVNb0liaEU/view?usp=sharing)

4.  Declaração da OMS sobre taxas de cesáreas https://www.unasus.gov.br/noticia/declaracao-da-oms-sobre-taxas-de-cesareas

5. Violência no parto: Na hora de fazer não gritou https://fpabramo.org.br/2013/03/25/violencia-no-parto-na-hora-de-fazer-nao-gritou/

6. Você sabe o que é violência obstétrica? http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/53079-voce-sabe-o-que-e-violencia-obstetrica

7. Estudando epsiotomia http://estudamelania.blogspot.com/2012/08/estudando-episiotomia.html

8. Indicações reais e fictícias de cesariana http://estudamelania.blogspot.com/2012/08/indicacoes-reais-e-ficticias-de.html

9. Doulas: definição e benefícios segundo as evidências científicas https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cssf/arquivos/audiencia-publica-2018/audiencia-publica-debater-o-pl-8363-2017-que-dispoe-sobre-o-exercicio-da-profissao-de-doula/apresentacao-maira

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