Ofício, saberes e práticas das parteiras tradicionais são Patrimônio do Brasil.

por | maio 20, 2024 | Sem categoria

Reconhecimento Oficial

No dia 9 de maio de 2024, conselheiras e conselheiros do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) aprovaram o reconhecimento do “Ofício, Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil” como Patrimônio Cultural do Brasil. A aprovação ocorreu durante a 104ª Reunião do Conselho Consultivo do órgão, e o bem será inscrito no Livro de Registro dos Saberes.

A lógica central do partejar tradicional é holística, baseada no atendimento contínuo e integral — corpo, família e comunidade —, e se pauta no cuidado e no acolhimento desde os momentos prévios até os posteriores ao parto, bem como na individualização do atendimento.”1

É para essas mulheres que, após a aprovação do parecer, o Iphan passará a dedicar esforços, segundo a diretora substituta do DPI, Diana Dianovsky, “na valorização e promoção desse patrimônio cultural”. “Um dos primeiros passos é ampliar a mobilização para a construção de um plano de salvaguarda que dê conta da diversidade da realidade do ofício das parteiras tradicionais do Brasil. Dessa forma, o Iphan poderá agir de forma coordenada, incluindo parceiros das esferas governamentais e da sociedade civil”, diz a diretora. 2

Essência e Abrangência

Os Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil correspondem a uma realidade presente em todo o território nacional. Compõem um repertório transmitido de geração a geração, mas que não deixa de se atualizar, mesclando conhecimentos tradicionais e religiosos com conhecimentos biomédicos. Essas mulheres dão continuidade a uma história ancestral, mas que ainda é viva e fundamental – sobretudo em zonas rurais ou urbanas periféricas e entre grupos da população historicamente desassistidos pelo Estado, como quilombolas e comunidades indígenas.

Em dossiê produzido por pesquisadores do Iphan e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em 2021, para instrução do processo de registro do bem como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, as parteiras tradicionais são descritas como “mestras do ofício do partejar, detentoras de um repertório de saberes e práticas acerca de todas as etapas da gestação (pré-natal, parto e pós-parto)”. Portanto sua assistência vai muito além do nascimento.

As parteiras tradicionais estão mobilizadas por questões práticas da vida da comunidade, pois além de parteiras são também mulheres, mães, avós e trabalhadoras. Portanto, as parteiras constituem lideranças da comunidade e são respeitadas pela responsabilidade que têm em relação ao parto-nascimento. Na prática, os remédios, banhos, chás, garrafadas, rezas e conselhos não são direcionados apenas às gestantes, puérperas e crianças, como também a outros membros da comunidade.

Na assistência à gestação, ao parto e ao puerpério, as parteiras acionam técnicas cujas funções práticas e simbólicas são fundamentais para a saúde e a qualidade de vida da gestante e do bebê. Essas mulheres, entendendo a gestação e o parto como um momento especial na vida da mulher, compartilham um sistema de cuidado constituído por dimensões biológicas e culturais de grande valor.

O cuidado das parteiras é pautado em um sistema que prioriza elementos da natureza para o atendimento, evita intervenções, fortale a empatia e a solidariedade entre mulheres; busca fomentar o envolvimento familiar no parto e no pós-parto; além de existir o agenciamento de uma experiência extraordinária ou religiosa no nascimento; e a valorização da casa como espaço privilegiado de realização do parto e do cumprimento do resguardo.

Valorização e Promoção

A patrimonialização, portanto, pode ser entendida como um instrumento para estreitar o diálogo e solucionar tensões entre conhecimento biomédico e os conhecimentos tradicionais, e ainda entre as políticas públicas de cultura e as de saúde, ambas articuladas para a defesa dos nossos bens culturais e das especificidades locais de atenção ao ciclo reprodutivo das mulheres.

O registro do ofício em questão mostra-se uma oportunidade de reparação do Estado às mestras parteiras, ao iluminar sua posição de detentoras de um bem cultural nacionalmente reconhecido, com práticas eficazes, repertório religioso sincrético, conhecimentos fitoterápicos consistentes, técnicas corporais sofisticadas e um entendimento do parto como um ritual que exige e produz uma rede com diversos agentes em interação . Trata-se de uma boa oportunidade para relacionar saúde e patrimônio e para reconhecer que o parto tem muito a falar sobre quem somos nós.

As parteiras tradicionais detêm conhecimentos femininos elaborados por mulheres para atender às mulheres. Elas são mestras vocacionadas, dedicadas a cuidar de outras mulheres durante a gravidez, acompanhar o seu parto e pós-parto nos mais diversos lugares; mulheres de seu tempo, ligadas às demandas contemporâneas sem perder as relações ancestrais.

Dar ao ofício de parteira tradicional o título de Patrimônio Cultural do Brasil é reconhecer e legitimar o conhecimento de várias comunidades do país, endossando e valorizando a atuação dessas mestras do cuidado. Além de reconhecer seus saberes como constituintes da cultura brasileira, um patrimônio do nosso povo, a prática das parteiras tradicionais precisa de amparo e proteção do Estado, por meio de políticas públicas, para potencializar sua atuação.

Referências:
Dossiê Parteiras Tradicionais do Brasil, IPHAN. 

Parteiras Tradicionais do Brasil: nosso Patrimônio Cultural

1- Dossiê IPHAN PARTEIRAS TRADICIONAIS DO BRASIL, p.7

2- Na 104ª Reunião do Conselho Consultivo do IPHAN. 

104ª Reunião do Conselho Consultivo – Tarde

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